quinta-feira, 12 de novembro de 2009

PLs de outrora - 1 vez por semana, a biografia light de um antepassado


II) Clara Augusta: capitalismo e devoção


O cadáver de Clara Augusta Pedroso de Lima foi - segundo os cronistas da época - acompanhado ao jazigo por uma multidão de pobres e clérigos. De uns e de outros, a mulher do Capitalista Mathias P.L. fora "desvelada protectora". E, aparentemente, o traço dominante da nossa biografada da semana foi uma generosidade severa, nada complacente com mentiras e/ou ocultações, direccionada sobretudo para a classe eclesiástica e para os poiarenses mais desvalidos.

Não devendo muito à beleza, mas desde muito nova tida por rica herdeira, a filha de "Mil Anjos" foi, aos 13 anos, pedida em casamento pela primeira vez pelo seu primo Mathias. Respondeu negativamente, alegando que, se cassasse, não poderia continuar a frequentar a "Mestra" (aonde ia acompanhada pela sua criada Carolina) - o que mostra uma pendência para a instrução pouco vulgar entre as suas conterrâneas. O primo insistiu aos 14 e, depois aos 15 anos - e recebeu sempre a mesma resposta. Aos 16, finalmente acedeu.

O pendor fortemente místico e a paixão pelos assuntos da Igreja, característica marcada dos que a rodeavam e provavelmente muito influenciada pelo seu prohenitor, ter-se-ão vindo a agravar à medida que os anos passavam, com as agruras que as infidelidades do marido lhe provocariam. Patrocinando generosamente tudo o que se relacionasse com a "sua" Capela de N. S. das Necessidades, na Risca-Silva, ofereceu à imagem principal o traje que esta ainda hoje ostenta.

Longe estaria, contudo, de imaginar esta mulher tão rica quão pideosa que, largas décadas passadas sobre a sua morte, uma neta "adoptiva"a imortalizaria numa passagem do premiado "Os Outros e Eu" (há pouco referido por JT), num excerto de uma conversa entre a Nela e o Tio Vasco:
"- Sabes como é que eu ia para a praia quando era miúdo?
- Não, como era?
- Vivíamos na nossa terra, e vínhamos de barco pelo rio abaixo. Levávamos uns poucos de dias a fazer o caminho que agora se faz em poucas horas.
- Devia ser divertido...
- E era! Para nóa era uma paródia! Mas para as criadas talvez não fosse...
- Porquê?
- Porque para não estarem a perder tempo sem fazerem nada durante a viagem, a minha avó lhes dava uma tarefa: vinham a fiar todo o caminho.
- A fiar?
- É verdade! Fiava-se e tecia-se em casa o linho a lã para a nossa roupa".
E assim era: todos os anos, Clara Augusta e Mathias P.L. embarcavam, no Porto da Raiva (onde possuíam casas, terrenos e armazéns), como todos os filhos - Mª dos Prazeres, Virgínia, Joaquim, Alfredo, Conceição, Adelaide, Aurora, Armando e Carmina - e empregados q.b. E iam, Mondego fora, passar um par de meses à Figueira.

2 comentários:

  1. generosidade severa, a cara simpática no retrato...afinal o "nosso" mau-feitio não foi herdado apenas da avó carolina ;)

    ResponderEliminar
  2. A Avó Clara Augusta, sempre severa e austera nas fotos, é uma das mulheres da família que mais admiro.

    Apesar de ter vivido numa época profundamente frustante para a sua condição (pois qualquer menina da sua época tinha apenas duas hipóteses, ou vir a ser «senhora de ...» ou entrar para um convento), conseguiu deixar bem viva a sua marca em terras de Poiares.

    Apesar de ser filha de "Mil Anjos" e de se ter casado com o "Sr Capitalista", dois homens muito influentes, sempre valorizou muito a sua formação/instrução o que fez escola nas mulheres PL.

    Para além disso, como bem refere L, sendo uma esposa devota, conseguiu conciliar essa autonomia intelectual, com uma notável acção caritativa na região.

    ResponderEliminar

Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.